O abolicionismo foi um movimento político, social e moral que buscou erradicar a escravidão, promovendo uma sociedade mais igualitária por meio de mobilizações populares, ações institucionais e alianças internacionais. No Brasil, desenvolveu-se no século XIX, em meio a tensões globais e locais, influenciado pelo fim do tráfico transatlântico e por experiências de abolição em outros países. Caracterizou-se pela união de esforços populares, diálogos internacionais e articulações institucionais, com líderes como Joaquim Nabuco e José do Patrocínio desempenhando papéis centrais. Seus objetivos iam além da liberdade dos escravizados, almejando também a inclusão social e a reconstrução da identidade nacional. Movimentos populares como quilombos e associações de alforria tiveram papel crucial, enquanto leis como a Eusébio de Queirós, o Ventre Livre e a Lei Áurea pavimentaram o caminho para a abolição definitiva em 1888.
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O abolicionismo foi um movimento que teve como principal objetivo a erradicação da escravidão, considerada por muitos como uma das mais graves violações dos direitos humanos na história. Trata-se de uma luta de caráter complexo, que reuniu esforços de diferentes segmentos da sociedade, desde políticos e intelectuais até movimentos populares e, especialmente, os próprios escravizados. No Brasil, o abolicionismo ganhou força no século XIX, quando as tensões sociais, políticas e econômicas tornaram evidente a inviabilidade do sistema escravagista. Conforme destacado por Joaquim Nabuco em sua obra O Abolicionismo, o movimento não se limitava a ser uma causa isolada, mas sim um processo profundamente ligado à transformação moral e social do país, buscando a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
Esse movimento, no entanto, não se restringiu ao Brasil. Em termos globais, o abolicionismo teve origem em países que já haviam iniciado suas transições para o trabalho livre, como Inglaterra e Estados Unidos. A mobilização antiescravista internacional influenciou diretamente o movimento brasileiro, especialmente por meio da troca de ideias e estratégias com abolicionistas britânicos, como demonstrado pela correspondência de Joaquim Nabuco com ativistas europeus e latino-americanos. Além disso, o abolicionismo brasileiro trouxe peculiaridades, pois lidava com uma sociedade em que a escravidão permeava quase todas as esferas da vida econômica e social.
O abolicionismo brasileiro deve ser compreendido dentro de um contexto histórico mais amplo, marcado por mudanças globais e locais. No plano internacional, o movimento antiescravista começou a ganhar força no final do século XVIII, impulsionado por ideias iluministas que pregavam a igualdade e a liberdade. No início do século XIX, países como Inglaterra, Estados Unidos e Haiti já haviam dado passos significativos em direção à abolição. Esse cenário internacional pressionava países como o Brasil, que ainda dependiam profundamente do trabalho escravo.
Internamente, o Brasil enfrentava uma conjuntura de mudanças. A Lei Eusébio de Queirós (1850) proibiu o tráfico transatlântico de escravos, marcando o início do declínio do sistema escravocrata. No entanto, a escravidão persistiu como uma estrutura econômica e social, sustentada pelo poder das elites agrárias. Esse período foi caracterizado por intensas disputas políticas entre grupos progressistas, que defendiam a abolição, e setores conservadores, que buscavam manter a escravidão como base da economia. A Lei do Ventre Livre (1871) e a Lei dos Sexagenários (1885) foram passos graduais rumo à abolição, mas também demonstraram a resistência das elites escravistas em aceitar mudanças radicais.
O abolicionismo no Brasil apresentou uma diversidade de características que o distinguiam como um movimento complexo:
O abolicionismo visava, em primeiro lugar, à abolição definitiva da escravidão, mas seus objetivos iam além. Defendia-se a integração dos libertos à sociedade, por meio do acesso à terra, à educação e aos direitos civis. Além disso, o movimento buscava a desconstrução da estrutura de poder que mantinha as elites agrárias como o principal grupo dominante no país. Como argumentava Joaquim Nabuco, a abolição era essencial não apenas para corrigir uma injustiça histórica, mas também para reconstruir a identidade nacional brasileira em bases igualitárias.
Movimentos populares desempenharam um papel central no abolicionismo brasileiro, muitas vezes desafiando as estruturas de poder de maneira direta. Quilombos, como o de Palmares, já simbolizavam, desde o período colonial, a resistência à escravidão. Na segunda metade do século XIX, associações como a Sociedade Nova Emancipadora se tornaram importantes para o financiamento de cartas de alforria. Essas organizações mostravam que os próprios escravizados e libertos estavam engajados ativamente em sua emancipação, mesmo diante de enormes desafios.
Dentre os muitos líderes do movimento abolicionista brasileiro, destacam-se figuras como:
O processo de abolição no Brasil foi marcado por uma série de leis, incluindo:
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A abolição da escravatura ocorreu no Brasil em 1888, com a Lei Áurea, e foi celebrada como um marco histórico, mas deixou inúmeras questões em aberto. Sem apoio econômico ou social, os libertos enfrentaram um contexto de exclusão, pobreza e discriminação, evidenciando que a abolição, embora legal, não foi acompanhada de uma inclusão efetiva. Isso perpetuou desigualdades que ainda hoje afetam a sociedade brasileira. Para saber mais sobre o assunto, clique aqui.
Em nível global, o abolicionismo trouxe grandes transformações sociais. Na Inglaterra, a abolição ocorreu em 1833, enquanto nos Estados Unidos foi formalizada em 1865, após a Guerra Civil. O Haiti, por sua vez, tornou-se um símbolo de resistência ao fundar a primeira república negra em 1804. Essas experiências influenciaram o Brasil, que se beneficiou das conexões internacionais para moldar sua luta abolicionista.
Questão 1
O abolicionismo no Brasil foi um movimento complexo, articulado em diversas frentes, desde iniciativas parlamentares até a mobilização popular e a ação de organizações emancipatórias. Sobre o movimento abolicionista no Brasil, é correto afirmar que:
A) foi totalmente desvinculado de influências internacionais, destacando-se pelo seu caráter autônomo e nacionalista.
B) se concentrou exclusivamente em mudanças legislativas promovidas por líderes parlamentares monarquistas.
C) se articulou em diferentes esferas, como mobilizações populares, ações institucionais e diálogos internacionais.
D) garantiu, após a abolição, a inclusão econômica e social dos libertos na sociedade brasileira.
E) teve sua maior força em movimentos armados liderados por escravizados em todo o país.
Resolução:
Alternativa C.
O abolicionismo brasileiro foi caracterizado pela atuação em diversas frentes, incluindo mobilizações populares, iniciativas parlamentares e conexões internacionais. As outras alternativas apresentam imprecisões: o movimento teve forte diálogo internacional (alternativa A), não se limitou ao Parlamento (alternativa B), não garantiu inclusão social plena dos libertos (alternativa D) e não foi dominado por movimentos armados (alternativa E).
Questão 2
O abolicionismo no Brasil foi impulsionado por transformações sociais e econômicas no século XIX, como a proibição do tráfico transatlântico pela Lei Eusébio de Queirós (1850) e os debates sobre a substituição do trabalho escravo pelo trabalho livre.
A resistência de setores escravistas à abolição no Brasil pode ser explicada principalmente:
A) pela forte dependência econômica do trabalho escravo, especialmente na agricultura de exportação.
B) pela falta de articulação entre os movimentos abolicionistas e os poderes políticos do período.
C) pelo isolamento do Brasil em relação às influências internacionais sobre o abolicionismo.
D) pela ausência de debates públicos e campanhas em defesa da liberdade dos escravizados.
E) pelo impacto limitado das legislações abolicionistas em frear o sistema escravocrata.
Resolução:
Alternativa A.
O sistema escravocrata era a base da economia brasileira, especialmente nas plantações de café e açúcar, dificultando sua abolição. As outras alternativas estão incorretas, pois os movimentos abolicionistas dialogaram com o poder político (alternativa B), o Brasil foi influenciado por experiências internacionais (alternativa C), houve amplos debates públicos (alternativa D) e as legislações abolicionistas representaram avanços graduais, mesmo que limitados (alternativa E).
Crédito de imagem
[1] Arquivo Nacional / Wikimedia Commons (reprodução)
Fontes
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Fonte: História do Mundo - https://www.historiadomundo.com.br/idade-moderna/abolicionismo.htm