História e Paradigma Indiciário

A relação entre História e Paradigma Indiciário foi explicitada pelo historiador italiano Carlo Ginzburg e constitui uma das mais importantes reflexões da área.
Historiador italiano Carlo Ginzburg, autor do ensaio “Sinais: raízes de um paradigma indiciário” *
Historiador italiano Carlo Ginzburg, autor do ensaio “Sinais: raízes de um paradigma indiciário” *
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Por Me. Cláudio Fernandes

Em diversas ocasiões a prática da historiografia, desde suas origens, foi comparada a atividades que necessitam da análise de indícios para tecer explicações. Exemplos dessas atividades são a medicina, investigação criminal, crítica de artes plásticas, psicanálise, entre outras. Entretanto, o autor responsável por sistematizar esse tipo de saber que é comum a todas essas áreas e, também, à história foi o italiano Carlo Ginzburg, que cunhou a expressão “paradigma indiciário” em um ensaio intitulado Spie. Radici di un paradigma indiziario (Sinais: raízes de um paradigma indiciário), publicado na coletânea Crisi della ragione, organizada por Aldo Gargani, que saiu pela editora Einaudi no ano de 1979.

Para Ginzburg, tanto a história quanto as disciplinas acima citadas partilham da prática de “rastreamento de sinais, indícios, signos” que remetem a algum evento, mas sem captá-lo em sua integridade. Assim, por exemplo, a medicina orienta-se pelos sinais de patologia que um corpo apresenta, como febre, dores, hematomas, inchaços, etc. O médico procede analisando esses indícios e submetendo o paciente a uma série de exames até estabelecer um diagnóstico seguro. Da mesma forma, um perito criminal analisa a cena de um crime, desde os sinais deixados no cadáver até elementos como pegadas, impressões digitais, etc.

O crítico de arte, sobretudo aquele encarregado de averiguar a autenticidade de uma obra clássica, também opera por meios de indícios muito sutis, característicos de cada pintor, irrepetíveis de tão singulares. A psicanálise fundada por Freud também vai nessa linha, interpretando fragmentos de imagens oníricas (sonhos) que os pacientes relatam. Ginzburg, em seu ensaio, conseguiu perceber que há uma forma de conhecimento que pode estar na fronteira entre o conhecimento rígido das ciências naturais – que operam por demonstração e verificação empírica dos dados analisados – e as formas criativas, como a literatura, poesia, mitos, etc. Entre essas duas instâncias, está o paradigma, isto é, o modelo, indiciário, que trabalha rastreando sinais tal como um caçador.

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Aliás, Ginzburg assinala que a sabedoria por meio de índices, de sinais, é tão antiga quanto a própria humanidade. Foi por meio de índices que o homem pré-histórico conseguir chegar até a patamares superiores de inteligência. O saber dos caçadores e dos observadores dos astros foi decisivo para o desenvolvimento da humanidade e para o aparecimento das primeiras civilizações.

Para a história, ou “ciência da história”, tal paradigma é imperativo, haja vista que o objeto de estudo do historiador é o passado. E, sendo passado, não há como acessá-lo diretamente, só há como tangenciá-lo por meio daquilo que nos ficou, dos “restos” desse passado. Grosso modo, dos indícios dos eventos passados. Desse modo, a história é um saber, ou uma ciência, indireto. Não há, para Carlo Ginzburg, como enquadrar a história fora dessa reflexão sobre paradigma indiciário.

* Créditos da imagem: Commons

Por Cláudio Fernandes