Abolicionismo
O abolicionismo foi um movimento político, social e moral que buscou erradicar a escravidão com o objetivo de promover uma sociedade mais igualitária.
Por Tiago Soares Campos
O abolicionismo foi um movimento político, social e moral que buscou erradicar a escravidão, promovendo uma sociedade mais igualitária por meio de mobilizações populares, ações institucionais e alianças internacionais. No Brasil, desenvolveu-se no século XIX, em meio a tensões globais e locais, influenciado pelo fim do tráfico transatlântico e por experiências de abolição em outros países. Caracterizou-se pela união de esforços populares, diálogos internacionais e articulações institucionais, com líderes como Joaquim Nabuco e José do Patrocínio desempenhando papéis centrais. Seus objetivos iam além da liberdade dos escravizados, almejando também a inclusão social e a reconstrução da identidade nacional. Movimentos populares como quilombos e associações de alforria tiveram papel crucial, enquanto leis como a Eusébio de Queirós, o Ventre Livre e a Lei Áurea pavimentaram o caminho para a abolição definitiva em 1888.
Leia também: Como foi a escravidão no Brasil?
Resumo sobre o abolicionismo
- O abolicionismo foi um movimento político, social e moral que visava erradicar a escravidão, promovendo uma sociedade mais justa e igualitária por meio de ações institucionais, mobilizações populares e alianças internacionais.
- O abolicionismo brasileiro desenvolveu-se no século XIX, em um cenário de mudanças globais, como o fim do tráfico transatlântico e a abolição em outros países, e tensões internas entre progressistas e conservadores na luta pela liberdade e modernização.
- O abolicionismo no Brasil foi complexo, unindo mobilização popular, diálogo internacional e esforços institucionais, com líderes que articularam redes locais e globais para desmantelar as estruturas do sistema escravocrata.
- Além da abolição da escravidão, o movimento buscava integrar os libertos à sociedade, promovendo direitos civis, educação e a reconstrução de uma identidade nacional livre de desigualdades.
- Movimentos populares fortaleceram o abolicionismo por meio de quilombos, fugas e associações como a Sociedade Nova Emancipadora, que arrecadavam fundos para alforrias e organizavam redes de apoio aos escravizados.
- Figuras como Joaquim Nabuco, José do Patrocínio e André Rebouças articularam ações parlamentares, campanhas na imprensa e redes internacionais, destacando-se como protagonistas do movimento abolicionista brasileiro.
- O processo abolicionista foi marcado por leis como a Eusébio de Queirós (1850), o Ventre Livre (1871), os Sexagenários (1885) e a Lei Áurea (1888), que gradualmente enfraqueceram o sistema escravocrata no Brasil.
- A abolição da escravatura, em 1888, foi uma conquista histórica, mas deixou os ex-escravizados em condições de vulnerabilidade, evidenciando a falta de políticas de inclusão e reparação social.
- O abolicionismo global foi impulsionado por países como Inglaterra, Haiti e Estados Unidos, cujas experiências influenciaram o movimento no Brasil e fortaleceram redes internacionais de luta contra a escravidão.
O que foi o abolicionismo?
O abolicionismo foi um movimento que teve como principal objetivo a erradicação da escravidão, considerada por muitos como uma das mais graves violações dos direitos humanos na história. Trata-se de uma luta de caráter complexo, que reuniu esforços de diferentes segmentos da sociedade, desde políticos e intelectuais até movimentos populares e, especialmente, os próprios escravizados. No Brasil, o abolicionismo ganhou força no século XIX, quando as tensões sociais, políticas e econômicas tornaram evidente a inviabilidade do sistema escravagista. Conforme destacado por Joaquim Nabuco em sua obra O Abolicionismo, o movimento não se limitava a ser uma causa isolada, mas sim um processo profundamente ligado à transformação moral e social do país, buscando a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
Esse movimento, no entanto, não se restringiu ao Brasil. Em termos globais, o abolicionismo teve origem em países que já haviam iniciado suas transições para o trabalho livre, como Inglaterra e Estados Unidos. A mobilização antiescravista internacional influenciou diretamente o movimento brasileiro, especialmente por meio da troca de ideias e estratégias com abolicionistas britânicos, como demonstrado pela correspondência de Joaquim Nabuco com ativistas europeus e latino-americanos. Além disso, o abolicionismo brasileiro trouxe peculiaridades, pois lidava com uma sociedade em que a escravidão permeava quase todas as esferas da vida econômica e social.
Contexto histórico do abolicionismo
O abolicionismo brasileiro deve ser compreendido dentro de um contexto histórico mais amplo, marcado por mudanças globais e locais. No plano internacional, o movimento antiescravista começou a ganhar força no final do século XVIII, impulsionado por ideias iluministas que pregavam a igualdade e a liberdade. No início do século XIX, países como Inglaterra, Estados Unidos e Haiti já haviam dado passos significativos em direção à abolição. Esse cenário internacional pressionava países como o Brasil, que ainda dependiam profundamente do trabalho escravo.
Internamente, o Brasil enfrentava uma conjuntura de mudanças. A Lei Eusébio de Queirós (1850) proibiu o tráfico transatlântico de escravos, marcando o início do declínio do sistema escravocrata. No entanto, a escravidão persistiu como uma estrutura econômica e social, sustentada pelo poder das elites agrárias. Esse período foi caracterizado por intensas disputas políticas entre grupos progressistas, que defendiam a abolição, e setores conservadores, que buscavam manter a escravidão como base da economia. A Lei do Ventre Livre (1871) e a Lei dos Sexagenários (1885) foram passos graduais rumo à abolição, mas também demonstraram a resistência das elites escravistas em aceitar mudanças radicais.
Quais as características do abolicionismo?
O abolicionismo no Brasil apresentou uma diversidade de características que o distinguiam como um movimento complexo:
- Interseccionalidade: o movimento reunia diferentes classes sociais e grupos raciais. Incluía intelectuais brancos, libertos, escravizados e aliados estrangeiros.
- Transnacionalidade: os abolicionistas brasileiros estavam em diálogo constante com movimentos internacionais, como os da Inglaterra e dos Estados Unidos. Joaquim Nabuco, por exemplo, articulava suas ações com ativistas britânicos para ampliar a pressão sobre o governo brasileiro.
- Mobilização popular: embora liderado por intelectuais, o abolicionismo teve uma base popular significativa. Escravizados organizavam fugas, criavam quilombos e participavam de sociedades emancipatórias, que arrecadavam fundos para a compra de liberdade.
- Ações legais e políticas: o movimento também atuava na esfera institucional, promovendo debates no Parlamento e pressionando por reformas legislativas. Joaquim Nabuco e José do Patrocínio foram exemplos de líderes que usaram a política e a imprensa para fortalecer a causa.
Principais objetivos do abolicionismo
O abolicionismo visava, em primeiro lugar, à abolição definitiva da escravidão, mas seus objetivos iam além. Defendia-se a integração dos libertos à sociedade, por meio do acesso à terra, à educação e aos direitos civis. Além disso, o movimento buscava a desconstrução da estrutura de poder que mantinha as elites agrárias como o principal grupo dominante no país. Como argumentava Joaquim Nabuco, a abolição era essencial não apenas para corrigir uma injustiça histórica, mas também para reconstruir a identidade nacional brasileira em bases igualitárias.
Movimentos populares no abolicionismo
Movimentos populares desempenharam um papel central no abolicionismo brasileiro, muitas vezes desafiando as estruturas de poder de maneira direta. Quilombos, como o de Palmares, já simbolizavam, desde o período colonial, a resistência à escravidão. Na segunda metade do século XIX, associações como a Sociedade Nova Emancipadora se tornaram importantes para o financiamento de cartas de alforria. Essas organizações mostravam que os próprios escravizados e libertos estavam engajados ativamente em sua emancipação, mesmo diante de enormes desafios.
Líderes do movimento abolicionista
Dentre os muitos líderes do movimento abolicionista brasileiro, destacam-se figuras como:
- Joaquim Nabuco: atuou como mediador entre redes sociais diversas, conectando a luta abolicionista local às redes transnacionais.
- José do Patrocínio: usou a imprensa para disseminar ideias abolicionistas, promovendo debates públicos e incentivando a mobilização popular.
- André Rebouças: além de engenheiro, foi um intelectual que via na abolição uma oportunidade de modernizar o Brasil economicamente.
Leis abolicionistas
O processo de abolição no Brasil foi marcado por uma série de leis, incluindo:
- Lei Eusébio de Queirós (1850): encerrou o tráfico transatlântico de escravos.
- Lei do Ventre Livre (1871): declarou livres os filhos de escravas nascidos após a promulgação.
- Lei dos Sexagenários (1885): concedeu liberdade aos escravizados com mais de 60 anos.
- Lei Áurea (1888): proclamou a abolição definitiva da escravidão.
Acesse também: Afinal, a escravidão no Brasil poderia ter sido abolida antes de 1888?
Abolição da escravatura no Brasil
A abolição da escravatura ocorreu no Brasil em 1888, com a Lei Áurea, e foi celebrada como um marco histórico, mas deixou inúmeras questões em aberto. Sem apoio econômico ou social, os libertos enfrentaram um contexto de exclusão, pobreza e discriminação, evidenciando que a abolição, embora legal, não foi acompanhada de uma inclusão efetiva. Isso perpetuou desigualdades que ainda hoje afetam a sociedade brasileira. Para saber mais sobre o assunto, clique aqui.
Abolicionismo no mundo
Em nível global, o abolicionismo trouxe grandes transformações sociais. Na Inglaterra, a abolição ocorreu em 1833, enquanto nos Estados Unidos foi formalizada em 1865, após a Guerra Civil. O Haiti, por sua vez, tornou-se um símbolo de resistência ao fundar a primeira república negra em 1804. Essas experiências influenciaram o Brasil, que se beneficiou das conexões internacionais para moldar sua luta abolicionista.
Exercícios resolvidos sobre abolicionismo
Questão 1
O abolicionismo no Brasil foi um movimento complexo, articulado em diversas frentes, desde iniciativas parlamentares até a mobilização popular e a ação de organizações emancipatórias. Sobre o movimento abolicionista no Brasil, é correto afirmar que:
A) foi totalmente desvinculado de influências internacionais, destacando-se pelo seu caráter autônomo e nacionalista.
B) se concentrou exclusivamente em mudanças legislativas promovidas por líderes parlamentares monarquistas.
C) se articulou em diferentes esferas, como mobilizações populares, ações institucionais e diálogos internacionais.
D) garantiu, após a abolição, a inclusão econômica e social dos libertos na sociedade brasileira.
E) teve sua maior força em movimentos armados liderados por escravizados em todo o país.
Resolução:
Alternativa C.
O abolicionismo brasileiro foi caracterizado pela atuação em diversas frentes, incluindo mobilizações populares, iniciativas parlamentares e conexões internacionais. As outras alternativas apresentam imprecisões: o movimento teve forte diálogo internacional (alternativa A), não se limitou ao Parlamento (alternativa B), não garantiu inclusão social plena dos libertos (alternativa D) e não foi dominado por movimentos armados (alternativa E).
Questão 2
O abolicionismo no Brasil foi impulsionado por transformações sociais e econômicas no século XIX, como a proibição do tráfico transatlântico pela Lei Eusébio de Queirós (1850) e os debates sobre a substituição do trabalho escravo pelo trabalho livre.
A resistência de setores escravistas à abolição no Brasil pode ser explicada principalmente:
A) pela forte dependência econômica do trabalho escravo, especialmente na agricultura de exportação.
B) pela falta de articulação entre os movimentos abolicionistas e os poderes políticos do período.
C) pelo isolamento do Brasil em relação às influências internacionais sobre o abolicionismo.
D) pela ausência de debates públicos e campanhas em defesa da liberdade dos escravizados.
E) pelo impacto limitado das legislações abolicionistas em frear o sistema escravocrata.
Resolução:
Alternativa A.
O sistema escravocrata era a base da economia brasileira, especialmente nas plantações de café e açúcar, dificultando sua abolição. As outras alternativas estão incorretas, pois os movimentos abolicionistas dialogaram com o poder político (alternativa B), o Brasil foi influenciado por experiências internacionais (alternativa C), houve amplos debates públicos (alternativa D) e as legislações abolicionistas representaram avanços graduais, mesmo que limitados (alternativa E).
Crédito de imagem
[1] Arquivo Nacional / Wikimedia Commons (reprodução)
Fontes
ALONSO, Angela. Joaquim Nabuco e a rede abolicionista transnacional. Novos Estudos Cebrap, n. 88, 2010.
AZEVEDO, Célia Maria Marinho. Onda negra, medo branco: o negro no imaginário das elites do século XIX. 2. ed. São Paulo: Annablume, 2004.
BETHELL, Leslie; CARVALHO, José Murilo de (Org.). Joaquim Nabuco e os abolicionistas britânicos: correspondência 1880-1905. Rio de Janeiro: Topbooks, 2008.
CASTILHO, Celso T. Abolitionism matters: the politics of antislavery in Pernambuco, Brazil, 1869-1888. PhD dissertation. University of California, Berkeley, 2008.
CHALHOUB, Sidney. Visões da liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na Corte. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977.
DRESCHER, Seymour. Abolition: a history of slavery and antislavery. Nova York: Cambridge University Press, 2009.
MACHADO, Maria Helena. O plano e o pânico: os movimentos sociais na década da abolição. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora da UFRJ/Edusp, 1994.
MENDONÇA, Renato de. Um diplomata na corte da Inglaterra. Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1942.
NABUCO, Joaquim. Minha formação. 13. ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999.
NABUCO, Joaquim. O abolicionismo. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2003.
ROCHA, Antonio Penalves. Abolicionistas brasileiros e ingleses: a coligação entre Joaquim Nabuco e a British and Foreign Anti-Slavery Society (1880-1902). São Paulo: Editora da Unesp, 2009.
SILVA, Eduardo. As camélias do Leblon e a abolição da escravatura: uma investigação de história cultural. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.