O fim da escravidão no Brasil foi um longo processo oficializado em 13 de maio de 1888, quando a princesa Isabel assinou a Lei Áurea após esta ter sido aprovada por senadores e deputados. No entanto, a Lei Áurea foi apenas o desfecho de um longo processo que se iniciou séculos antes, quando os primeiros escravizados passaram a lutar contra a escravidão.
No século XIX, o abolicionismo passou a ganhar força no Brasil e, após a Guerra do Paraguai, diversas entidades abolicionistas foram fundadas no território nacional. O movimento ganhou apoio de variados grupos, como militares, artistas, intelectuais, profissionais liberais e setores da Igreja Católica.
Nesse período, diversas leis foram aprovadas, e elas foram gradualmente diminuindo o número de escravos. Na assinatura da Lei Áurea, os escravizados já tinham pouca importância na economia brasileira.
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Resumo sobre o fim da escravidão no Brasil
- O fim da escravidão no Brasil foi oficialmente estabelecido em 13 de maio de 1888, com a promulgação da Lei Áurea.
- A escravidão perdurou por mais de três séculos no Brasil.
- A Revolução Haitiana, o iluminismo e a pressão da Inglaterra influenciaram o processo que levou ao fim da escravidão no Brasil.
- Diversas leis foram aprovadas, na segunda metade do século XIX, objetivando acabar gradualmente com a escravidão, entre elas a Lei Eusébio de Queirós, a Lei do Ventre Livre e a Lei dos Sexagenários.
- O Brasil foi um dos últimos países do mundo a abolir a escravidão.
- A partir de 1870, o movimento abolicionista ganhou força no Brasil, atraindo simpatizantes de diversas classes sociais.
- Após a abolição, o Estado brasileiro não indenizou os ex-escravizados ou seus descendentes. Também não adotou políticas públicas para integrar essa população à sociedade e economia brasileiras.
Contexto histórico do fim da escravidão no Brasil
A escravidão foi adotada no Brasil desde o Período Pré-Colonial, sendo os primeiros escravizados os indígenas. Em diversos locais do litoral, estabeleceram-se traficantes de escravizados que vendiam essas pessoas para portugueses, espanhóis e franceses que visitavam a costa brasileira.
Com o início da colonização e da produção açucareira no Brasil, chegaram os primeiros escravizados africanos, que, gradativamente, substituíram os escravizados indígenas. Por três séculos, milhões de escravizados provenientes da África chegaram ao Brasil, desempenhando as mais variadas tarefas, trabalhando nos canaviais e engenhos, na mineração, na pecuária, sendo escravizados domésticos, de ganho ou de aluguel.
No século XVIII, o iluminismo, que se originou na Europa, chegou à América, levando aos primeiros movimentos pelo fim da escravidão. No Haiti, colônia francesa, eclodiu a Revolução Haitiana, em 1791, que contou com maciça participação de escravizados e libertos e tinha como objetivos a abolição da escravidão e a independência do Haiti.
A revolução foi marcada pela violência e pelo assassinato de boa parte da população branca do país e acabou com a vitória dos revolucionários e a consequente abolição da escravidão. As notícias dos acontecimentos no Haiti provocaram medo na elite brasileira, que buscou realizar uma abolição sobre seu controle antes de que os escravizados fizessem o mesmo.
Na Inglaterra o movimento abolicionista se popularizou no início do século XIX. Em 1807, o país proibiu o tráfico negreiro, e, em 1833, a escravidão foi abolida em todo o Império Britânico, na época o maior do mundo. Após a abolição, a Inglaterra passou a pressionar outros países para que fizessem o mesmo, inclusive o Brasil.
A pressão inglesa foi motivada por questões humanísticas, mas também por questões econômicas. Os trabalhadores escravizados não ganhavam salário e, dessa forma, não eram consumidores dos produtos ingleses. Feita a abolição, os trabalhadores se tornariam assalariados, ampliando o mercado consumidor mundial.
Foi nesse contexto de iluminismo, Revolução Haitiana e pressão inglesa que ideia de abolir a escravidão passou a ser discutida no Brasil entre a população em geral, na Câmara e no Senado.
Como foi o fim da escravidão no Brasil?
A história tradicional afirma que o fim da escravidão no Brasil ocorreu por causa de um ato de bondade da princesa Isabel, que, em 13 de maio de 1888, assinou a Lei Áurea, abolindo a escravidão em todo o território brasileiro. Contudo, a Lei Áurea foi o desfecho de séculos de luta de muitos indivíduos contra a escravidão e de forte pressão popular no século XIX.
Desde os primeiros anos de colonização do Brasil, e a implementação da escravidão, os escravizados resistiram a ela de diversas formas, como por fugas, ataques aos senhores e feitores e a formação de quilombos. O mais famoso deles foi o Quilombo dos Palmares, que, por quase um século, foi um pequeno reino africano livre no Brasil. Milhares de outros quilombos foram fundados em todo o território brasileiro nos mais de três séculos de escravidão.
Após a Guerra do Paraguai, onde brancos e negros lutaram lado a lado pelo Império do Brasil, diversas associações foram fundadas com o objetivo de abolir a escravidão. No início da década de 1880, existiam centenas dessas associações no país. Em 1883, foi fundada a Confederação Abolicionista, com o objetivo de organizar e unificar a luta dos diferentes movimentos. José do Patrocínio e André Rebouças foram as principais lideranças da confederação, o que demonstra o protagonismo da população negra na luta pela abolição.
Diversas estratégias de luta foram utilizadas pelos abolicionistas. Algumas associações realizavam eventos para arrecadar fundos, como bailes, rifas e bazares, e os recursos arrecadados eram utilizados na compra de alforrias. A publicação de jornais, livros e artigos também foi uma estratégia largamente utilizada pelo movimento abolicionista. Nesse campo José do Patrocínio teve destaque, trabalhando em diversos jornais na época e sendo dono de dois deles. Outros buscaram a via jurídica, como fez Luís Gama, que, por meio da justiça, conseguiu libertar cerca de 500 escravizados.
Na década de 1880, grande parte da população brasileira apoiava a abolição, e, por pressão popular, a elite econômica e política cedeu por diversas vezes, aprovando leis que foram lentamente acabando com a escravidão. Em 1888, ao assinar a Lei Áurea, aprovada pelo Senado, a princesa Isabel sofria grande pressão popular.
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Quanto tempo durou a escravidão no Brasil?
A escravidão no Brasil durou 388 anos, sendo legal durante todo o Período Colonial e por quase todo o Período Imperial. De forma legal, ela ocorreu de 22 de abril de 1500, quando Portugal tomou posse do Brasil, até 13 de maio de 1888, quando a Lei Áurea foi sancionada pela princesa Isabel.
Leis abolicionistas
O processo de abolição da escravidão no Brasil foi controlado pela elite brasileira, que garantiu que ela ocorresse de forma lenta, não causando, assim, danos econômicos aos proprietários de escravizados e à economia brasileira. A seguir, as principais leis abolicionistas.
- Lei Feijó: aprovada em 7 de novembro de 1831, proibiu o tráfico de escravos para o Brasil. A lei foi aprovada por causa de pressão da Inglaterra, que ameaçava o Brasil com sanções econômicas e com a apreensão dos navios negreiros. Contudo, nunca foi posta em prática e não houve qualquer tentativa das autoridades brasileiras em aplicá-la. Por esse motivo, ela ficou conhecida como “lei para inglês ver”, expressão utilizada ainda hoje no Brasil para designar leis que não são cumpridas ou tarefas realizadas apenas para que terceiros vejam.
- Lei Eusébio de Queirós: foi aprovada pelo legislativo brasileiro em 1850 e, novamente, proibiu o tráfico de escravos da África para o Brasil. Desta vez, a lei foi aplicada, os portos passaram a ser fiscalizados e os infratores foram punidos. A chegada de novos escravizados ao Brasil caiu drasticamente, embora alguns traficantes ainda continuassem a trazê-los para o Brasil de forma ilegal.
- Lei do Ventre Livre: foi aprovada em 1871 pelo Senado, pela Câmara dos Deputados e sancionada pela princesa Isabel. Ela ocupava o trono, pois Dom Pedro II estava no exterior. A lei estabelecia que as crianças nascidas de mães escravizadas seriam livres. Ela também estabelecia que a criança deveria ficar com a mãe até os oito anos de idade, quando o proprietário da mãe poderia optar por libertar a criança e receber uma indenização do Estado ou utilizá-la como escrava até os 21 anos. A criança, quando liberta, deveria ficar em uma instituição do Estado. Como não foram criadas instituições suficientes, as crianças nascidas de mães escravizadas foram, na maioria dos casos, também escravizadas até completarem 21 anos.
- Lei dos Sexagenários: também conhecida como Lei Saraiva-Cotegipe, foi promulgada em 1885 e instituiu que os escravizados que completassem 60 anos, ou já tivessem mais de 60 anos na data de sua promulgação, seriam considerados livres.
- Lei Áurea: a lei que definitivamente aboliu a escravidão no Brasil. Ela foi aprovada pelo Senado, pela Câmara dos Deputados e assinada pela Princesa Isabel. A Lei Áurea é uma das mais importantes e curtas da história do Brasil, tendo apenas dois artigos: “1°: É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil. Art. 2°: Revogam-se as disposições em contrário”.
O que aconteceu após o fim da escravidão no Brasil?
Após o fim da escravidão, não houve um projeto de integrar os ex-escravizados e seus descentes à sociedade brasileira por meio de políticas públicas que garantissem a essa população o acesso à educação, à saúde e à formação profissional. Pelo contrário, houve um processo de exclusão da população negra do nosso país e a tentativa de substituí-la por imigrantes europeus.
Desde o início das discussões sobre a abolição, houve a preocupação da elite política e econômica do Brasil em encontrar alternativas para a mão de obra escravizada. Uma das soluções encontradas foi o estímulo da imigração para o Brasil, principalmente de europeus. A solução buscava, ainda, o branqueamento da raça brasileira, substituindo a população negra pela branca em uma política racista de Estado que durou até as primeiras décadas do século XX.
Exercícios resolvidos sobre o fim da escravidão no Brasil
Questão 1
(Enem)
TEXTO I
Em todo o país, a lei de 13 de maio de 1888 libertou poucos negros em relação à população de cor. A maioria já havia conquistado a alforria antes de 1888, por meio de estratégias possíveis. No entanto, a importância histórica da lei de 1888 não pode ser mensurada apenas em termos numéricos. O impacto que a extinção da escravidão causou numa sociedade constituída a partir da legitimidade da propriedade sobre a pessoa não cabe em cifras.
ALBUQUERQUE. W. O jogo da dissimulação: abolição e cidadania negra no Brasil. São Paulo: Cia. das Letras, 2009 (adaptado).
TEXTO II
Nos anos imediatamente anteriores à Abolição, a população livre do Rio de Janeiro tornou-se mais numerosa e diversificada. Os escravos, bem menos numerosos que antes, e com os africanos mais aculturados, certamente não se distinguiam muito facilmente dos libertos e dos pretos e pardos livres habitantes da cidade. Também já não é razoável presumir que uma pessoa de cor seja provavelmente cativa, pois os negros libertos e livres poderiam ser encontrados em toda parte.
CHALHOUB, S. Visões da liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na Corte. São Paulo: Cia. das Letras, 1990 (adaptado).
Sobre o fim da escravidão no Brasil, o elemento destacado no Texto I que complementa os argumentos apresentados no Texto II é o(a):
A) variedade das estratégias de resistência dos cativos.
B) controle jurídico exercido pelos proprietários.
C) inovação social representada pela lei.
D) ineficácia prática da libertação.
E) significado político da Abolição.
Resolução:
Alternativa E
Ambos os textos defendem que, embora não tenha tido um efeito prático tão grande, uma vez que existiam poucos escravizados no Brasil na época da assinatura da Lei Áurea, ela teve um importante papel político.
Questão 2
(UFPR)
Em 1888, a princesa Isabel, filha do imperador do Brasil, Pedro 2º, assinou a Lei Áurea, decretando a abolição […]. A decisão veio após mais de três séculos de escravidão, que resultaram em 4,9 milhões de africanos traficados para o Brasil, sendo que mais de 600 mil morreram no caminho.
(Amanda Rossi e Camilla Costa, postado em 13 de maio de 2018 – BBC Brasil em São Paulo. Disponível em: https://www.bbc.com/ portuguese/brasil-44091469. Acesso em 25 de junho de 2019.)
De acordo com o trecho acima, considere as seguintes afirmativas:
1. A chamada “Lei Áurea”, assinada pela princesa Isabel, não pode ser vista como uma concessão da monarquia, sendo resultado de um longo processo de luta e resistência que contou com a presença ativa de escravizados e escravizadas para sua libertação do cativeiro.
2. No período imediato que sucedeu à abolição, os libertos puderam contar com medidas de apoio na forma de distribuição de pequenos lotes de terra, tal como aconteceu nos Estados Unidos após a Guerra Civil, com a chamada “Reconstrução”.
3. Escravizados e escravizadas receberam apoio de muitos setores da sociedade da época ligados ao movimento abolicionista, sendo Luís Gama, filho de escrava e advogado autodidata, um dos personagens mais célebres e atuantes, empenhando-se na libertação de centenas de cativos e cativas.
4. Os segmentos da sociedade adeptos do regime escravista defendiam a “emancipação gradual” e nutriam o profundo receio de que a abolição imediata da escravidão trouxesse desorganização econômica e provocasse o caos social.
Assinale a alternativa correta.
A) Somente a afirmativa 3 é verdadeira.
B) Somente as afirmativas 1 e 2 são verdadeiras.
C) Somente as afirmativas 2 e 4 são verdadeiras.
D) Somente as afirmativas 1, 3 e 4 são verdadeiras.
E) As afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras.
Resolução:
Alternativa D
A abolição da escravidão foi fruto de anos de luta de diversas pessoas e grupos sociais, não uma concessão da monarquia brasileira. Durante os anos de escravidão, diversas estratégias foram utilizadas para combatê-la; Luís Gama, por exemplo, optou pela luta jurídica. Após a abolição da escravidão, não houve qualquer tentativa do Estado brasileiro de integrar os ex-escravizados à sociedade e economia brasileiras.
Crédito de imagem
[1] Arquivo Nacional / Wikimedia Commons (reprodução)
Fontes
MAMIGONIAN, Beatriz. Africanos livres: A abolição do tráfico de escravos no Brasil. Companhia das Letras, São Paulo, 2017.
MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Ser escravo no Brasil: séculos XVI ao XIX. Editora Vozes, São Paulo, 2016.
PATROCÍNIO, JOSÉ. NABUCO, Joaquim. REBOUÇAS, André. Panfletos abolicionistas. Penguin-Companhia das Letras, São Paulo, 2024.